A Nuvem Socialista

Image courtesy of FreeDigitalPhotos.net
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por Marcelo H. Almeida

Hoje em dia é comum você ouvir falar da tal nuvem, aquela coisa abstrata na qual todos os seus vídeos, músicas, textos e dados ficam armazenados para que você possa acessá-los no dispositivo de sua escolha, em qualquer lugar, quer seja na sua casa, na rua, no cinema onde você fica no Facebook ao invés de ver a porcaria do filme, e até mesmo em Timbuktu.

É tanta modernidade que dá até preguiça de fazer backup dos meus arquivos no HD externo ou ir até a livraria adquirir aquele livro que pergunta quem mexeu no seu queijo quando você o encara.

É um mundo selvagem lá fora e prefiro ficar em casa comprando e enviando coisas automaticamente para esta entidade cósmica da qual nada sei a respeito.

Como tenho tempo de sobra, vou dedicar estes minutos extras a depositar meus melhores pensamentos no Facebook porque tudo isso não é feitiçaria, é tecnologia.

E assim foi até uma manhã em 2009 na qual os donos de e-readers que compraram o livro 1984, pagando provavelmente o mesmo preço da loja, ironicamente viram o mesmo desaparecer como mágica de seus dispositivos.

Como se isso não fosse trauma suficiente, uma mulher norueguesa teve sua conta na Amazon revogada pela empresa e com ela todos os seus livros, sem receber o dinheiro de volta por nenhum deles. É como se em uma bela manhã de domingo você acordasse e encontrasse sua estante de livros vazia.

Mas como é possível? Eu comprei este livro e paguei um bom dinheiro por ele! É meu!

A parte que você pagou está certa, mas o livro que você comprou na Amazon, assim como o filme que você na iTunes não são de sua propriedade. Eles são das empresas que te venderam porque são considerados softwares, e como tal você possui uma mera licença de uso. Em outras palavras, você paga e eles deixam você usar, assim como o Windows ou outro programa instalado em seu computador.

Se eles não gostarem mais de você, podem simplesmente falar: Me devolve! É meu! Não te empresto mais! E não tem absolutamente nada que você possa fazer. Acho que esse negócio de propriedade privada está fora de moda na internet nos dias de hoje.

Mas não fique triste! Sabe aquele post do Facebook legal que você publicou? Eles podem usar para o que bem entenderem, ou nas palavras deles: uma licença mundial não exclusiva, transferível, sublicenciável, livre de royalties, para usar qualquer conteúdo IP publicado por você.

Mas todo mundo sabe que o Facebook é rebelde e não respeita nada. Verdade, mas infelizmente esse tipo de política vem desde a época do Yahoo, passando pelo Google e Orkut. Até mesmo aquela foto da salada que você pediu no McDonald´s e postou no Instagram não era mais sua, até que todo mundo se revoltou e eles voltaram atrás.

Em troca da comodidade, você permite que essas empresas usufruam de tudo aquilo que você produziu, que pode não ter valor para você, mas é o motivo pelo qual elas existem e valem bilhões.

Quando você coloca uma foto que pegou na internet em seu post, ele pode ser derrubado porque não pagou nada pelos direitos, mas quando a foto é sua não pode exigir nenhum centavo, porque automaticamente cedeu todos os direitos de exploração da mesma quando a publicou.

Vocês lembram da história na qual Steve Jobs “convenceu” os donos das grandes gravadoras a vender as músicas no iTunes? Sabem porque concordaram? Porque o lucro da distribuição de conteúdo vem da capacidade de controlar o acesso a ele. Quanto mais difícil, mais caro. Quando a distribuição se tornou irrestrita, o valor caiu.

E qual a melhor forma de controlar a distribuição? Centralizá-la, mantendo a propriedade, mas cedendo o uso, tendo direito de restringi-lo a qualquer momento.

Isso me lembra o discurso central do socialismo que pregava uma sociedade mais justa na qual em nome de todos, ninguém possuía nada. Mas entre as linhas de cada frase, escondiam-se barreiras e restrições, fazendo com que o dinheiro que estava na posse encontrasse um novo mestre: O controle.

Neste modelo não importava mais ter e sim fazer. Em outras palavras, criava-se dificuldade para vender facilidade e quem pagava mais tinha acesso mais amplo àquilo que queria.

Distribuição eficiente é algo caro e você paga cada centavo com cada coisa que publica.

E sabe onde está tudo isso? Naquele texto enorme chato que você clicou dizendo que aceitava só para poder se inscrever correndo no serviço da moda que te permite compartilhar vídeos de gatos engraçados.

Sempre lemos tudo em detalhes antes de assinar um papel, porque queremos saber os benefícios, encargos e compromissos assumidos, mas quando esta assinatura é feita através de um clique no meio de milhares, temos a impressão que ela não tem o mesmo valor daquela feita por extenso.

Não devemos nos esquecer que toda revolução tecnológica e econômica ocorrida nos últimos vinte anos foi construída um clique por vez, portanto clique com responsabilidade.

Marcelo Henrique Almeida
Marcelo Henrique Almeida
Marcelo é apaixonado por cultura e tecnologia e sempre que pode    mistura os dois. Escreve artigos e livros para mostrar que existe    cultura além do pop e tecnologia além da Apple.
Contato:twitter.com/mhalmeida

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